No Domingo fui ver a apresentação do Conjunto de música antiga da UFF, com repertório de cantos indígenas da América, pelo evento Brasil: A margem. Um evento que apresentava toda a cultura indígena brasileira em diversos escopos. A Teko Porã (Que quer dizer o bem viver da comunidade), cosmovisão e expressividades indígenas. A apresentação, diga-se de passagem, com lotação esgotada, foi emocionante, com participação de integrantes antigos e um coro gigante. Foi lindo ouvir canções de toda América e principalmente, para mim, ouvir O Canto do Pajé, de Heitor Villa Lobos, que me transportava para minha memória afetiva, do qual cantei essa música diversas vezes pelo Coral do Centro Educacional de Niterói, sob regência do maestro Ermano Soares de Sá, recentemente falecido. Que Deus o tenha.
Me chamou a atenção, quando foram os discursos de despedida de aposentadoria de mais um membro do grupo, se falou sobre a luta que a UFF vai fazer em prol da manutenção da universidade pública, do incentivo à cultura e contra o fim do ministério da cultura, assim como a defesa e empoderamento das minorias, principalmente os povos indígenas que estão sendo dizimados numa escala impressionante nesse governo. O discurso em si não me causou estranheza e sim dos velhinhos que estavam assistindo a apresentação, com caras de poucos amigos, e possivelmente, eleitores do atual governo. Acabaram saindo no meio dos discursos. Ora, são contra o discurso, mas estava lá, compraram ingresso?
Como um governo que quer o porte de armas, liberar a caça aos animais silvestres, incentiva a invasão de terras indígenas por parte dos grileiros, milícias e fazendeiros, assim como quer doara Amazônia aos americanos pode se sensibilizar com as lutas e cânticos desses povos? É incompatível! Somos endividados com os indígenas que aqui estavam antes da chegada dos Portugueses, com mais de 5 mil línguas existentes. Exterminamos quase todos e os que existem ainda estão sofrendo com invasões e mortes e nunca se deixou conspurcar pela má índole dos brancos.
A maior parte das línguas indígenas encontra-se em risco de ser extinta. Suas terras são alvo constante de interesses comerciais, enquanto para eles é fonte de alimento, assim como para seu desenvolvimento que são negligenciados década após década pelo Estado Brasileiro. Esse então...o que dizer de saúde e escolarização, que são inadequados e com o crescimento do interesse cristão nesse novo escopo de ovelhas, suas línguas mães estão sendo deixadas de lado e como vivem através de tradição oral, serão esquecidas em pouco tempo. Línguas como o Akuntsú (seis falantes), Piripkúra (três falantes) e Xipáya (1 falante), vão sumir da face da Terra em anos, meses ou dias.
O povo deu atestado para essa matança. Legalizou a ignorância (no sentido de ignorar as informações e seguir o que o whatsapp, ou sua limitada opinião diz). No filme O terceiro homem, Harry Lime, em um texto que é atribuído a Orson Welles, que faz o papel, defende que, em 300 anos de vilania e intriga, Florença produziu o melhor da arte ocidental enquanto em um período de retidão, a Suíça, por exemplo, produziu o relógio cuco. Talvez assim se sintam os defensores do estado bárbaro que estamos vivendo nos dias de hoje em nosso país. Mas evidentemente, se ignora os fatos, se defende idéias que não tem menor sentido, mas que profundamente, acreditam em algo que defendem como misoginia, homofobia e etc. por isso, temos defensores da ausência de vacinas, que ficam doentes provocadas pela falta de remédio e assim por diante.
Lembrando que o maior Florentino, ante florentino, o monge Savonarola, pregava os bons costumes e cidadãos de bem, convenceu parte da população a queimar livros, objetos de arte seculares, instrumentos musicais numa imensa fogueira das vaidades. Nesse momento, me passa a minha canção de memória afetiva de Villa Lobos:
Ó tupã tira de mim essa saudade. Anhangá me fez sonhar. Com a terra que perdi...